"Brasília tem centros comerciais, muitos porteiros e pessoas normais", o rádio repete e repete e eu bato a mão direita na perna para marcar o ritmo. O motorista do carro aumenta o volume e acelera. Puxo o ar queimante mais fundo para ver se entra algum alento em mim.
O asfalto brilhante, lisinho, é coisa de filme porque estamos no período de seca. Deslizando por ele, o carro passa anônimo em frente a todos os pontos de decisão política e consumo apócrifo. Invisíveis, reverenciamos Kubitschek, Costa, Niemeyer e os Candangos. Xingamos os FDPs ao passar em frente ao Congresso. Analisamos o ritmo da marcha dos Dragões da Independência. Conhecemos todas as asas, setores, quadras, zonas e folhas secas das árvores (e nenhum rosto e nenhuma voz e nenhum corpo).
A poeira vermelha gruda nos nossos sapatos; ligar os pés a essa terra exige resistência à falta de umidade e grande desejo por horizontes vazios.
Filha
Há 3 meses
4 comentários:
Também tive essa impressão, de prima. Depois de morar doze anos em BSB digo que é uma cidade porreta para se morar, fazer grandes amigos, ganhar dinheiro e se divertir em Salvador nas férias. Abr. Carlos Barbosa
Fiqui muito feliz com teu link. As notas mínimas estão lá no anjo baldio. Um forte abraço.
Clarice Lispector deve ter mesmo razão ao dizer que Brasília é uma prisão ao ar livre...
Katherine, ah..., Katherine, Brasília sem os políticos que para lá os brasileiros mandam seria outra cidade, de um outro país. Mas Brasília é brasileiríssima (e sem estereótipos), principalmente no mal-estar que não consegue deixar de provocar. Mas há vida nas entrelinhas do poder, te garanto, sempre só nas entrelinhas.
Postar um comentário